O artigo 7º da Constituição da República estabelece que a relação de emprego deve ser protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa. Por decorrência, é proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, complicações de saúde, etc.
Apesar do comando constitucional, a legislação trabalhista permite ao empregador romper injustificada e unilateralmente o contrato. No entanto, o ordenamento jurídico não ampara o exercício abusivo desse direito. Isso significa que o direito potestativo de romper o contrato não é absoluto (a nenhuma das partes) e deve ser exercido dentro de parâmetros mínimos de legalidade. Ainda que lhe seja lícito dispensar o empregado sem justa causa, ao empregador não é permitido fazê-lo por motivos antijurídicos.
Noutras palavras, a dispensa sem justa causa é um direito do empregador, o que não significa autorizar, contudo, que possa daquela valer-se para a prática de atos discriminatórios, vexatórios ou inibitórios, ainda que eventualmente não tenha a intenção de fazê-lo, pois a honra, a intimidade e a imagem dos empregados são direitos personalíssimos indisponíveis e infensos à subjetividade do empregador.
Dito isso, pode-se considerar discriminatória a despedida de empregado enfermo, pois sabidamente se situa entre aqueles grupos vulneráveis que podem ser facilmente “descartados” do sistema produtivo, bastando que o empregador invoque o direito potestativo de despedir. O empregador que, ciente da doença, da restrição de capacidade e da necessidade de afastamento do empregado o dispensa imotivadamente viola o dever de solidariedade que decorre do art. 3º, I, da Constituição da República, aplicável às relações privadas e, em especial, aos contratos de trabalho e comete ato ilícito por exercer direito que excede os limites da boa-fé objetiva.
A consequência é o reconhecimento de nulidade do ato de demissão. Por isso, quando há indícios de despedida discriminatória incumbe ao empregador provar que a dispensa ocorreu por razão séria e justa.
Acrescente-se ainda que quando a alegação de dispensa discriminatória tem origem em doença, um parâmetro objetivo e seguro a ser seguido é a Súmula 443, do c. TST, cujos termos sinalizam, claramente, que não basta que o empregado esteja doente, mas a doença deve ser “grave” e mais que isso, essa grave doença pressupõe repercussão social na vida do empregado, na forma de “estigma ou preconceito”.
Uma vez reconhecida a dispensa discriminatória em Juízo, o empregado haverá de ser reintegrado ao trabalho com o pagamento dos salários e vantagens do período de afastamento, ou, indenização material equivalente, além de indenização por danos morais. A reintegração ao emprego, nessas hipóteses, impõe-se como forma de devolver o trabalho, que foi abusivamente suprimido do empregado, e principalmente para ampará-lo diante da notória dificuldade de recolocação no mercado de trabalho.
TRT-PR-13-09-2016 EMPREGADA PORTADORA DO VÍRUS HIV. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 443 DO TST. Presume-se discriminatória dispensa de empregada portadora de HIV, no entanto, tal presunção é apenas relativa, podendo ser infirmada por prova em sentido em contrário, cujo ônus recai sobre o empregador (artigo 818 da CLT c/c artigo 373, I, do CPC), do qual não se desincumbiu. No caso em tela, ficou comprovado que o empregador tinha prévia ciência da doença da autora, não havendo prova robusta de que a dispensa não foi discriminatória. TRT-PR-17362-2015-004-09-00-0-ACO-31502-2016 – 6A. TURMA. Relator: FRANCISCO ROBERTO ERMEL. Publicado no DEJT em 13-09-2016
TRT-PR-19-02-2016 DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 443 DO TST. A despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito é presumivelmente discriminatória (Súmula 443, TST). Não é esse, contudo, o caso dos autos, em que o Autor relata o diagnóstico de osteocondroma. Assim, o ônus probatório quanto ao fato constitutivo do direito é do Reclamante (art. 818 da CLT e art. 333, I do CPC). Ausente a prova de que a Réu tinha conhecimento dos problemas de saúde do Demandante ou mesmo que o agravamento do quadro foi anterior à demissão, reputa-se que o empregador utilizou-se de seu direito potestativo para rescindir o contrato de trabalho, o que não constitui qualquer abuso do direito ou violação à boa-fé objetiva. Recurso conhecido e não provido. TRT-PR-00218-2015-666-09-00-0-ACO-04906-2016 – 5A. TURMA. Relator: SERGIO GUIMARÃES SAMPAIO. Publicado no DEJT em 19-02-2016