Depois de debate tenso, Comissão de Constituição e Justiça modifica atendimento a vítimas de violência sexual. Matéria vai a plenário
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou hoje (21) o Projeto de Lei (PL) 5.069/13, que modifica a Lei de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual (Lei 12.845/13). O PL torna crime anunciar, induzir ao uso ou fornecer meios ou substâncias abortivas a uma gestante. Também proíbe prestar qualquer auxílio à mulher que o pratique mesmo que se trate de uma vítima de estupro , ainda que sob o pretexto de redução de danos. A matéria segue para votação no plenário da Câmara.
As penas previstas variam de quatro a oito anos de detenção. Se o agente é funcionário da saúde pública ou é médico, farmacêutico ou enfermeiro, a pena é agravada e sobe para cinco a dez anos. A punição ainda é aumentada em um terço se a gestante for menor de idade.
O PL também revoga artigos da Lei 12.8045/13, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual, dificultando ainda mais o acesso das mulheres a essa política de saúde.
A sessão da CCJ que aprovou a proposta de Cunha teve o auditório lotado e debates tensos. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) contestou. Para ela, toda a proposta está escrita de forma que não é possível saber quais suas reais consequências. “Eu gostaria de ter certeza de que a mulher vai ser atendida pelo serviço de saúde, e não numa delegacia, porque é isso que preconizam todos os especialistas. Devemos votar essa proposta pensando nas vítimas”, enfatizou.
A deputada Erika Kokay (PT-DF) lembrou que a proposta modifica o entendimento do que é violência sexual e estupro, para os efeitos da lei de atendimento às vítimas. Na lei está expresso que violência é qualquer ato não consentido, mas a proposta delimita ao que está definido no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40). “Isso quer dizer que o entendimento hoje é de que a palavra da mulher vale, e é importante dizer que o atendimento deve acolher essas mulheres, e não desconfiar delas”, defendeu a parlamentar.
Erika também criticou a proposta argumentando que as mulheres vítimas de estupro poderão ser penalizadas porque não terão acesso à “pílula do dia seguinte” e que as mulheres pobres é que serão ainda mais prejudicadas, já que a medida não vai impedir que os abortos continuem acontecendo no país. “As mulheres ricas conseguem recorrer a clínicas no exterior. As pobres continuarão correndo risco de vida ao tentar um aborto clandestino”, afirmou Erika ao portal G1. Ela chegou a apresentar um requerimento para adiar a votação, mas a sugestão não foi aceita.
Para a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ), a proposta piora uma conquista das mulheres, que é o atendimento humanitário em serviço de saúde. “A decisão sobre se ela quer ou não ir à delegacia deve ser da mulher, mas depois de ter seu corpo vilipendiado, nenhuma mulher pode ser obrigada a fazer um exame de corpo de delito”, declarou.
Fundamentalismos
Segundo a justificativa de Eduardo Cunha, “a legalização do aborto vem sendo imposta a todo o mundo por organizações internacionais inspiradas por uma ideologia neomaltusiana de controle populacional”.
“Nós viemos aqui para defender a vida; e punir quem de forma covarde faz anúncio ou induz alguém a fazer aborto. É uma medida justa para coibir esse crime”, defendeu o relator da proposta, deputado Evandro Gussi (PV-SP).
A deputada Renata Abreu (PTN-SP) defendeu o relatório, e disse que médicos lhe ofereceram a opção de abortar quando ela tinha 17 anos, e que esse tipo de apologia ao aborto é que precisa ser punida com maior dureza. “Eu não tinha condições de saber as consequências daquele ato, e essa não deve ser uma prática”, disse.
Destaques
Após a aprovação do texto, três destaques tentaram modificar a proposta. A principal discussão foi sobre o encaminhamento obrigatório das vítimas a uma delegacia e ao exame de corpo de delito. Embora o relator tenha retirado do texto uma parte que deu margem a críticas de que o exame de corpo de delito seria pré-requisito para o atendimento das vítimas, o texto foi criticado por colocar entre as obrigações do serviço de saúde o encaminhamento da vítima à delegacia. “Essa medida protege as provas e busca punir os agressores, não vemos razão para que seja retirada do texto”, afirmou o deputado Marcos Rogério (PDT-RO)